Boletim tlim n.º 52 ★ Janeiro de 2024

Olá!

Sou o David Almas, atleta de baixa competição, investidor preguiçoso e ex-jornalista aposentado desde os 41 anos. Está a ler o boletim tlim, uma publicação eletrónica que procura ajudar os leitores a fazerem mais pelo seu dinheiro.

Nesta quinquagésima segunda edição, trago-lhe apenas um tema: onde investir em 2024. Estive todo o passado mês de dezembro em busca dos melhores investimentos para si.

Porque deve considerar o que tenho para lhe dizer sobre investimentos? Acompanho os mercados ininterruptamente há mais de 24 anos: profissionalmente, fui jornalista de Finanças ao longo de um par de décadas; academicamente, sou mestre em Finanças e pós-graduado em Análise Financeira; pessoalmente, a minha carteira regista uma rentabilidade anual de 11,20% nos últimos 10 anos. Nos últimos 23 anos, ganhei provavelmente 10% por ano.

Espero que a leitura desta primeira edição de 2024 seja útil.

Bom Ano Novo! 🥳

— David Almas

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Onde investir em 2024

Por David Almas a 1 de janeiro de 2024 às 00h01

Se é um dos afortunados com uma carteira de investimentos, despendeu certamente de tempo e de recursos na busca das melhores aplicações para o seu património. É provável que as recomendações listadas neste artigo não mereçam uma alteração à sua estratégia.

Embora acredite que os instrumentos financeiros que listo ao longo desta edição do boletim tlim sejam as melhores opções neste início de ano, as mudanças drásticas na carteira geram frequentemente encargos e impostos que mutilam os retornos futuros do património. Se ponderar alterações à sua estratégia de investimento após ler esta análise, calcule o impacto financeiro dessas mudanças. Confirme que os benefícios esperados no longo prazo são superiores aos custos estimados da troca.

Este extenso artigo divide-se nestas secções:

  1. O que é um investimento?
  2. O que não é um investimento?
  3. A melhor estratégia: ações e obrigações para o longo prazo
  4. O melhor veículo para a maioria dos investidores: fundos passivos
  5. PPR não são a melhor opção
  6. Investimento direto em ações e obrigações
  7. As melhores opções de baixo risco
  8. Resumo

Todos os cálculos neste artigo foram processados com os preços disponíveis a 31 de dezembro de 2023. As principais fontes de informação que usei foram a Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, a Curvo, a JustETF, a Morningstar, as sociedades gestoras de fundos de investimento e as entidades comercializadoras, bem como as investigações académicas citadas ao longo deste texto.

O que é um investimento?

Poupar é transportar o dinheiro no tempo: o que não se consome agora — a poupança — será consumido no futuro. Investir é potencialmente o melhor modo de transporte da poupança: dota o dinheiro de crescimento.

Ao contrário das aplicações especulativas, o investimento é suportado num rendimento potencial. As ações pagam dividendos, as obrigações têm cupões e o imobiliário gera rendas. Mesmo que, numa situação particular, um destes ativos não distribua rendimentos — um fundo de ações de acumulação, uma obrigação de cupão zero, um imóvel devoluto —, é possível extrapolar o rendimento potencial para calcular um preço justo a pagar pelo investimento. São os rendimentos esperados que retiram o carácter especulativo aos investimentos.

Ações

Investir numa ação de uma empresa significa que se é dono de uma parte dessa firma. Ter uma ação confere-lhe o direito a receber dividendos, quando a companhia tem margem financeira para os distribuir, e a votar nas assembleias gerais de acionistas, que decidem o rumo da sociedade.

Os académicos concordam que, historicamente, as ações, quando inseridas numa carteira diversificada, geram mais ganhos de longo prazo para os investidores. Destaco dois estudos:

É importante aferir a rentabilidade real dos instrumentos financeiros nas análises de retornos de longo prazo, isto é, a rentabilidade acima da inflação. Ao excluir-se o aumento de preços, percebe-se o incremento do poder de compra fornecido pelos investimentos. Uma rentabilidade real de 5% por ano significa que o património consegue pagar mais 5% de bens e serviços a cada ano que passa. É possível comprar o dobro das coisas após 14 anos, sensivelmente.

Muitos dizem que as ações são mais rentáveis no longo prazo, mas também são mais voláteis. Não é verdade: os retornos dos mercados acionistas são mais voláteis no curto prazo; no longo prazo, até podem ser menos voláteis do que outros instrumentos frequentemente promovidos como mais seguros.

A base de dados criada por Robert Shiller — que contribuiu para o investigador receber o Prémio Nobel da Economia em 2013 — mostra que, enquanto os retornos reais das obrigações norte-americanas estenderam-se entre -1,78% por ano e 7,96% por ano em períodos de 24 anos desde 1871, as ações renderam anualmente entre 1,86% e 12,77% nesses períodos de 24 anos. Estatisticamente, o risco das ações foi inferior ao das obrigações em aplicações de 24 anos ou mais, mostra esta base de dados. No muito longo prazo, as ações podem ser menos voláteis do que as obrigações.

Obrigações

Investir em obrigações é o equivalente a emprestar dinheiro a empresas, governos e outras entidades. Normalmente, a remuneração destes títulos de dívida é o cupão: o emitente da obrigação paga periodicamente um montante aos obrigacionistas. No vencimento, os investidores recuperam o valor nominal dos títulos.

As carteiras de obrigações tendem a ser mais estáveis do que os mercados acionistas no curto prazo. As séries de Shiller revelam que as ações norte-americanas renderam, em termos reais, entre -58,12% e 151,31% em períodos de 12 meses desde 1871. O retorno real das obrigações norte-americanas variou entre -22,86% e 41,22% em intervalos de 12 meses. (Há, todavia, segmentos obrigacionistas que podem ser muito voláteis, como os dos mercados emergentes ou dos títulos empresariais de alto risco.)

Historicamente, o retorno dos mercados obrigacionistas é muito inferior ao dos investimentos acionistas:

Embora rendam tendencialmente menos do que as ações, a estabilidade das obrigações colocam-nas entre as preferências dos aforradores mais conservadores ou dos investidores que projetam necessitarem das suas poupanças no curto ou no médio prazo.

Imobiliário

Os académicos que estudam os desempenhos de longo prazo do imobiliário não conseguem chegar a acordo sobre a rentabilidade histórica deste mercado.

Em 2017, Òscar Jordà e os seus colegas revelaram no seu estudo pioneiro uma visão otimista:

Posteriormente, vários estudiosos avisaram que esse número era exagerado, incluindo:

Não há estatísticas oficiais em Portugal suficientemente longas e completas para retirar conclusões de longo prazo. Os dados da avaliação bancária das habitações portuguesas, divulgados mensalmente pelo Instituto Nacional de Estatística, revelam uma apreciação mediana de 2,66% por ano acima da inflação desde 2011, mas este número não contabiliza as potenciais rendas nem os encargos dos proprietários dos imóveis, tal como nos estudos citados anteriormente.

Se pondera investir em imobiliário, saiba que:

Se, após estes avisos, continuar a desejar expor a sua fortuna ao mercado imobiliário, diversifique: procure outros segmentos do mercado, outras regiões geográficas e outros tipos de arrendatário.

O que não é um investimento?

São muitos os ativos adquiridos na expectativa de encontrar posteriormente um comprador disposto a pagar mais para o deter. Não distribuem rendimentos e, logo, os seus proprietários não conseguem balizar um intervalo de preços justos para os transacionarem. Na minha definição, não são investimentos.

Bens duráveis

Qual é o preço justo de um grama de ouro? Recentemente, comprou-se e vendeu-se em Londres a 60 euros, mais 11% do que um ano antes. Está, obviamente, mais caro, mas estará caro? Não sei. Ninguém sabe, porque a única referência é o preço histórico.

Se a EDP distribuir anualmente dividendos de 19 cêntimos por ação, como os analistas que acompanham a sua atividade esperam nos próximos 12 meses, um investidor pode estar disposto a pagar 4,18 euros por ação, porque isso significaria a recuperação do seu investimento em 22 anos (4,18€ ÷ 0,19€). Uma investidora pode oferecer 210 mil euros por um apartamento, porque, se conseguir arrendá-lo por 870 euros, como prevê, recuperará o seu investimento em 20 anos (210 000€ ÷ (870€ × 12)).

Não é possível conduzir um raciocínio semelhante com o ouro e outros bens duráveis.

Quem defende a adição de ouro a uma carteira de longo prazo normalmente aponta duas vantagens: a resistência à inflação e a redução da volatilidade da carteira.

O ouro não protege contra a inflação. “Os bens duráveis dificilmente são uma boa cobertura contra a inflação”, concluiu Christophe Spaenjers quando estudou os retornos de vários bens físicos ao longo do século XX, incluindo ouro, prata e diamantes. Não é preciso recuar tanto: desde 1980, o ouro depreciou-se, em euros e escudos antes do euro, 0,42% por ano, em termos reais.

Adicionar exposição aurífera pode reduzir a volatilidade do património. O ouro é tão volátil como uma carteira diversificada de ações, mas, graças à correlação baixa entre estes ativos, a sua combinação permite baixar a volatilidade dos investimentos. Por exemplo, um património igualmente dividido entre ações mundiais e ouro teria apenas três quartos da volatilidade de uma carteira exclusivamente exposta às ações ou ao metal desde 1980. Juntar ouro às ações baixa, todavia, o retorno potencial dos investimentos: a rentabilidade real desse património desceria de 6,27% por ano para 4,74% por cento desde 1980.

Bitcoins e criptoativos

A rede de Bitcoins é um sistema de pagamentos que recorre a um ativo eletrónico, o Bitcoin, como meio de troca. É um sistema que procura ser descentralizado: não são precisos regulamentos ou leis, porque as regras estão definidas no próprio código informático, o protocolo do Bitcoin.

Não acredito que o Bitcoin alguma vez se tornará uma moeda, porque:

Se o Bitcoin não for uma moeda, então a sua utilidade é nula; o seu valor justo é zero. Este raciocínio pode ser extrapolado para todos os outros criptoativos que desejam ser moedas e nunca o serão.

Desaconselho Bitcoins aos leitores do boletim tlim desde maio de 2021, quando o seu preço estava em 45 mil euros. Agora, quando vale perto de 38 mil euros, mantenho a recomendação.

Bens emocionais

Victoria Dobrynskaya e Julia Kishilova, da Escola Superior de Economia em Moscovo, compilaram uma base de dados de preços de conjuntos de Lego para aferir se seriam um bom investimento. Concluíram que, entre 1987 e 2015, a rentabilidade real dos Legos foi de 8% por ano. “O investimento em brinquedos oferece uma atrativa relação entre risco e retorno”, escreveram.

O interesse da comunicação social foi grande quando as investigadoras russas publicaram os primeiros números, em 2019. À portuguesa Exame, Dobrynskaya explicou que “os ganhos mais altos ocorrem no final da nossa amostra, em 2015”.

O que passou ao lado de muitos jornalistas foi o alerta das académicas para os encargos de transação e de armazenamento: os retornos históricos apontados por Dobrynskaya e Kishilova não os incluíam.

“À semelhança de outros investimentos alternativos, a transação de Legos tem custos relativamente altos”, escreveram. Descobriram que a negociação destes brinquedos, maioritariamente na plataforma eBay nos Estados Unidos da América, tem custos mensais fixos e despesas variáveis na venda. Estimaram um custo da venda equivalente a 9,15% do preço. A armazenagem não é tão cara como noutros investimentos alternativos, mas basta abrir ou amachucar a embalagem para uma grande parte do seu valor dissipar-se.

Dobrynskaya e Kishilova não foram as primeiras a avisar para o pesado impacto das transações e da armazenagem na rentabilidade dos bens emocionais. Quando Christophe Spaenjers estudou o desempenho do ouro, da prata e dos diamantes, também avaliou o retorno da arte, dos selos, do vinho e dos violinos no século XX. Embora tenha indicado que possam ajudar a diversificar o património financeiro, avisou que “os colecionáveis tiveram as apreciações mais elevadas [entre os bens duráveis], mas os custos de transação são também muito altos nestes mercados”.

Os bens colecionáveis podem, todavia, trazer grandes benefícios: os dividendos emocionais, isto é, o prazer de os deter. Não é possível apreçar a beleza de uma pintura, o deleite de completar uma coleção ou a expectativa de provar um vinho. Fruto da elevada volatilidade e dos altos encargos, não recomendo bens emocionais aos leitores do boletim tlim, exceto quando fortemente associados a esses dividendos emocionais.

Divisas

Apostar em câmbios a pensar que se pode ganhar dinheiro é ridículo. O mercado cambial é um jogo de soma nula. Quando um jogador ganha, outro perde. A soma de todos os resultados dos negócios cambiais resulta obrigatoriamente num saldo de zero. Se se subtrair os encargos de transação (comissões e taxas de juro), a expectativa mais racional de resultado é um prejuízo. Os investidores não devem procurar prováveis prejuízos.

Derivados

O mercado de derivados pode ser muito útil aos investidores: permite cobrir riscos aos quais alguém não se quer expor. É possível, por exemplo, cobrir o risco cambial de um investimento fora da Zona Euro. Infelizmente, muitos “investidores” usam os derivados para especular no curto prazo, o que gera frequentemente péssimos resultados.

Veja-se o exemplo dos contratos diferenciais, conhecidos na terminologia inglesa por contracts for difference ou CFD: um “comprador” e um “vendedor” acordam trocar a diferença entre o preço atual de um determinado ativo e o preço desse mesmo ativo no final do contrato; muitas vezes, esses contratos são alavancados, o que significa que a exposição ao ativo é superior ao valor investido.

Em 2016, inundada com reclamações, a Autoridade Europeia de Valores Mobiliários e Mercados emitiu um alerta aos investidores da União Europeia sobre os perigos dos contratos diferenciais. Mais tarde, avançou para uma medida mais drástica: obrigou os comercializadores desses contratos a anunciar pública e periodicamente a proporção de clientes com prejuízos nos contratos diferenciais. Descobriu-se, então, que, na maioria dos intermediários, mais de 75% dos clientes perdia dinheiro. Em todos, o número de investidores perdedores superava os ganhadores.

A proporção de perdedores não melhorou. A sucursal portuguesa da XTB, que recebeu quase metade das ordens sobre CFD em Portugal nos primeiros 11 meses de 2023, indica agora no rodapé da sua página que “78% das contas de investidores não profissionais perdem dinheiro quando negoceiam CFD com este distribuidor”.

Os CFD continuam a ser os instrumentos derivados mais populares entre os investidores. Em 2022, havia 5,9 milhões de CFD na União Europeia, especialmente CFD acionistas.

Mesmo os investidores menos sofisticados são atraídos para soluções que envolvem produtos derivados. Há pouco mais de dois anos, o EuroBic colocou junto dos seus clientes um depósito estruturado que dependeria da evolução do preço das ações de cinco companhias do ramo automóvel. Quando atingiu a maturidade, em setembro passado, os aforradores ganharam exatamente nada: estiveram dois anos com o dinheiro empatado para alcançarem uma taxa de juro nula.

O EuroBic sabia à partida que o produto renderia provavelmente zero, segundo os números projetados nos vários cenários de desempenho incluídos na documentação.

A solução do EuroBic não é um caso isolado: os 36 depósitos estruturados que se venceram em 2023 renderam, em média, 0,06% por ano, segundo a lista compilada pelo Banco de Portugal.

A melhor estratégia: ações e obrigações para o longo prazo

O seu património financeiro deve ser espalhado entre exposição acionista — que oferece o maior retorno potencial — e obrigacionista — que promove a estabilidade. Como decidir essa divisão? É, talvez, a mais importante resolução das suas finanças.

Mais obrigações ou mais ações? As rentabilidades anuais esperadas acima da inflação foram deduzidas do desempenho das ações e das obrigações entre 1900 e 2022, consoante a última edição do Credit Suisse Global Investment Returns Yearbook. As proporções de períodos negativos das carteiras foram calculadas a partir dos desempenhos mensais dos fundos iShares Core MSCI World UCITS ETF (ações) e Xtrackers Global Government Bond UCITS ETF 1C EUR Hedged (obrigações) entre janeiro de 1985 e dezembro de 2023, incluindo simulações históricas fornecidas pela Curvo. Quando nunca houve um período negativo, o campo está vazio.
Percentagem da carteira em ações
0%20%40%60%80%100%
Rentabilidade anual esperada acima da inflação1,7%2,4%3,0%3,7%4,3%5,0%
DuraçãoProporção de períodos negativos
1 ano17%12%17%21%24%26%
2 anos9%5%13%16%18%19%
3 anos6%4%9%15%17%20%
4 anos5%3%4%12%17%19%
5 anos5%5%12%20%
6 anos6%0%5%12%
7 anos5%2%6%9%
8 anos5%4%7%8%
9 anos4%4%6%9%
10 anos3%1%7%11%
11 anos1%4%11%
12 anos2%6%
13 anos3%

A primeira linha do quadro anterior, da rentabilidade real esperada, indica a estimativa mais realista para o retorno do seu investimento. Está entre 1,7% por ano acima da inflação, se se expuser totalmente aos mercados obrigacionistas, e 5% por ano acima da inflação, se optar por uma carteira diversificada de ações.

O retorno futuro do seu património será muito provavelmente diferente, porque os mercados financeiros são incertos. Com a informação que temos hoje, aquelas estimativas estão, porém, entre as melhores que podemos usar. Os resultados passados não são garantia de resultados futuros, mas a história repete-se teimosamente no longo prazo.

Se os leitores decidissem apenas pela primeira linha do quadro anterior, optariam sempre pela última coluna — da carteira composta exclusivamente por ações —, porque rende potencialmente mais. A rentabilidade dessa estratégia é, todavia, mais incerta do que a das outras, como se percebe pela proporção de períodos com resultados negativos.

A história mostra que é mais provável perder dinheiro ao fim de uma década com um património acionista do que se introduzir um pouco de exposição obrigacionista à sua carteira. A confiar nos números do quadro anterior, a probabilidade de prejuízo decenal numa carteira diversificada de ações é de 11%, mas apenas de 1% se tiver 60% da carteira em ações e 40% em obrigações.

Cabe-lhe a si decidir qual a combinação entre ações e obrigações que mais bem satisfaz o seu perfil e o seu prazo de investimento. Se precisar do dinheiro nos próximos 5 anos, talvez não deva optar por uma carteira com 80% ou mais em ações, porque, historicamente, mais de 1 em cada 10 períodos ofereceram perdas aos investidores.

Independentemente da divisão da carteira, nunca houve um período de 14 ou mais anos em que os patrimónios diversificados de ações e de obrigações — representados nesta análise pelos fundos iShares Core MSCI World UCITS ETF e Xtrackers Global Government Bond UCITS ETF 1C EUR Hedged desde 1985 — tenham alcançado prejuízos. Isto não quer dizer que não haja desvalorizações temporárias (como as descidas drásticas de 2022 ou no mês após a declaração de pandemia em 2020), pelo contrário: as quedas bolsistas são muito frequentes. As percentagens do quadro anterior são válidas apenas no final do prazo, isto é, para quem investiu e permaneceu investido durante todo o período.

Quanto maior a exposição às ações, maior tende a ser a volatilidade da carteira no curto prazo. Não se esqueça desta afirmação quando investir, porque uma das piores coisas que pode fazer é alienar um instrumento financeiro apenas por registar uma desvalorização. A volatilidade faz parte do quotidiano dos investidores. Se não tem estômago para os altos e os baixos, salte imediatamente para a melhor solução de baixo risco.

A partir da análise do quadro anterior, concluo que:

A partir das várias conversas que enceto com subscritores do boletim tlim, penso que a maioria dos leitores deveria apontar para uma carteira composta por 60% em ações e 40% em obrigações. A probabilidade de prejuízo é reduzida após 5 anos de investimento e o retorno potencial, de 3,7% acima da inflação, é bom. Essa rentabilidade duplica o poder de compra da poupança a cada 19 anos, aproximadamente.

O melhor veículo para a maioria dos investidores: fundos passivos

Os investidores podem adquirir diretamente ações, obrigações e imóveis. Não é normalmente a opção mais inteligentes: as despesas tendem a ser relativamente elevadas, exige muito trabalho de investigação e acompanhamento e pode ser fiscalmente pouco eficiente.

Os instrumentos mais indicados para investir são normalmente os fundos de investimento, porque:

Na maioria dos fundos de investimento oferecidos pela banca, os gestores responsáveis pela administração das carteiras procuram apresentar retornos acima da concorrência e dos índices de referência. É, no entanto, uma tarefa ingrata: a maioria não consegue bater os índices.

Por um lado, os índices representam todo o mercado e, em média, os gestores ganham o mesmo que o mercado, porque são o mercado. Por outro lado, os índices não têm encargos e, logo, em média, a rentabilidade líquida de encargos dos fundos ficam atrás dos avanços dos índices.

A S&P Dow Jones Indices, um dos principais construtores de índices financeiros, publica semestralmente relatórios sobre a capacidade de os fundos de ações baterem os seus índices de referência. Nas principais regiões, os índices ficam à frente de 80% a 90% dos fundos nas rentabilidades a 5 anos ou mais. Por exemplo, 93% dos fundos de ações europeias renderam menos do que as suas referências nos últimos 10 anos.

Além de serem raros os fundos com sobredesempenhos, é muito difícil detetar antecipadamente os futuros líderes, porque não há persistência nos ganhos. Os vencedores do passado não são normalmente os vencedores do futuro.

No início de 2018, não havia um fundo de ações mundiais mais rentável do que o Morgan Stanley Global Opportunity: tinha rendido 17,50% por ano no quinquénio anterior. Recomendei-o na altura para os investidores que procuravam fundos de ações de gestão ativa. Hoje, encontro mais de uma centena de fundos de ações mundiais que ganharam mais do que o fundo da Morgan Stanley nos últimos 5 anos.

Há quase 6 anos, recomendei também o fundo UBS BF Euro High Yield: rendera 6,38% por ano na década anterior; o segundo melhor fundo de obrigações de alto rendimento em euros ficara muito atrás, 5,79% por ano. Hoje, os retornos dos últimos 5 ou 10 anos do UBS BF Euro High Yield são apenas ligeiramente melhores do que a média dos fundos da categoria.

À maioria dos investidores, aconselho fundos passivos: ao contrário dos fundos de gestão ativa, os administradores dos fundos de gestão passiva não procuram bater a concorrência ou os índices; seguem uma estratégia predefinida, normalmente a replicação de um índice.

Como não é preciso uma equipa à procura dos melhores investimentos, os fundos passivos, incluindo os fundos de índice, são muito mais baratos. A taxa anual de encargos correntes entre os fundos distribuídos em Portugal começa nos 0,06% do património.

Os fundos de índice também tendem a ser mais diversificados, porque as suas carteiras geralmente replicam quase exatamente a composição dos índices. Não são raros os fundos de índice com centenas ou milhares de ativos.

Há fundos passivos que podem ser subscritos junto da banca e, mais frequentemente, há outros que podem ser comprados e vendidos nas bolsas de valores, recorrendo a um intermediário financeiro. Estes últimos compõem a maioria dos fundos cotados, conhecidos por exchange-traded funds, ETF ou trackers.

Os melhores fundos mistos

A tentação natural de quem quer expor o seu património aos mercados acionistas e obrigacionistas é combinar um fundo de ações com um fundo de obrigações. Não é a melhor solução: um fundo misto — um cabaz exposto simultaneamente às ações e às obrigações — é melhor, porque:

Recomendo quatro fundos mistos, em função da exposição acionista e obrigacionista que se deseja:

  1. Vanguard LifeStrategy 20% Equity UCITS ETF (EUR) Accumulating
  2. Vanguard LifeStrategy 40% Equity UCITS ETF (EUR) Accumulating
  3. Vanguard LifeStrategy 60% Equity UCITS ETF (EUR) Accumulating
  4. Vanguard LifeStrategy 80% Equity UCITS ETF (EUR) Accumulating

Os Vanguard LifeStrategy são fundos passivos cotados na bolsa. Investem exclusivamente em fundos de índice geridos pela mesma sociedade gestora para alcançar a exposição desejada. A percentagem na designação dos fundos representa o peso dos mercados acionistas mundiais na carteira. A diferença para 100% é a exposição tendencial aos mercados globais de obrigações.

Que proporção em ações? Estes Vanguard LifeStrategy, lançados em dezembro de 2020, são fundos de acumulação, isto é, reinvestem todos os rendimentos recebidos. (Há também fundos Vanguard LifeStrategy de distribuição, mas não os recomendo). O ISIN é um código único de identificação de instrumentos financeiros composto por 12 caracteres alfanúmericos.
Vanguard LifeStrategy 20% EquityVanguard LifeStrategy 40% EquityVanguard LifeStrategy 60% EquityVanguard LifeStrategy 80% Equity
ISINIE00BMVB5K07IE00BMVB5M21IE00BMVB5P51IE00BMVB5R75
TipoFundo misto passivo cotado
Sociedade gestoraVanguard
CustodianteBrown Brothers Harriman
Bolsa recomendadaMilão: VNGA20Milão: VNGA40Milão: VNGA60Milão: VNGA80
Outras bolsasXetra: V20A
Amesterdão: V20A
Xetra: V40A
Amesterdão: V40A
Xetra: V60A
Amesterdão: V60A
Xetra: V80A
Amesterdão: V80A
Taxa anual de encargos correntes0,25%
Rentabilidade de 1 ano7,09%9,24%12,49%14,99%
Rentabilidade anualizada de 3 anos-2,72%0,01%3,17%6,22%
Indicador de risco
1 = baixo; 7 = alto
3334

Aconselho que compre os fundos Vanguard LifeStrategy na bolsa de Milão através de um intermediário económico, porque é onde há mais operações sobre estes títulos, o que se traduz em melhores preços para os investidores. Se o seu intermediário financeiro não lhe fornecer o acesso a Milão, opte pelo segmento Xetra da bolsa de Francoforte. A última escolha deve ser Amesterdão.

Recomendo os Vanguard LifeStrategy, porque:

Um Vanguard LifeStrategy é uma solução chave-na-mão: compra-se e esquece-se até se precisar do dinheiro. Por 25 cêntimos anuais por cada 100 euros investidos, os gestores da Vanguard têm todo o trabalho de investir nas principais obrigações de todo o mundo e nas ações das maiores empresas do planeta.

Os melhores fundos de ações

Se deseja expor-se completamente aos mercados acionistas, recomendo o investimento num fundo de ações dos mercados desenvolvidos. Evite fundos geográfica ou setorialmente focados: o risco é muito superior.

Se tivesse apostado no setor tecnológico, teria ganhado cerca de 50% em 2023, mas, se tivesse optado pelo setor mineiro, poderia ter perdido cerca de 10%. Se tivesse escolhido um fundo de ações dos Estados Unidos da América, teria recebido uma mais-valia de 21%, mas, se tivesse eleito a China ou a Rússia, teria um prejuízo de 21% ou superior. Menos arriscado: um fundo de ações dos mercados desenvolvidos rendeu cerca de 20% em 2023.

Muitos investidores tropeçam na armadilha do crescimento: pensam que uma expectativa de mais crescimento económico é sinónimo de maiores valorizações futuras. É falso. Por exemplo, os mercados emergentes crescem mais do que os desenvolvidos, mas não tendem a render mais. Dimson, Marsh e Staunton indicam que a rentabilidade real das ações dos mercados emergentes foi de 3,7% por ano entre 1900 e 2022, enquanto, nos mercados desenvolvidos, chegou a 5,1%.

Não recomendo fundos de ações de mercados emergentes nem fundos de ações mundiais que incluam mercados emergentes, porque:

Também não recomendo fundos de ações especialmente focados nos princípios das finanças sustentáveis, responsáveis ou éticas, porque:

Assim, os critérios que sugiro na busca dos melhores fundos de ações é:

O custo da replicação é a diferença entre a rentabilidade do índice e o desempenho histórico do fundo. Em teoria, o custo da replicação tende para a taxa de encargos correntes; significaria que a replicação é perfeita. Há, no entanto, fundos de índice que se desviam do seu barómetro. O ideal é encontrar fundos em que o custo da replicação é nulo ou, mesmo, negativo.

Após usar as ferramentas de pesquisa da Morningstar, da JustETF, da TrackingDifferences e de alguns intermediários financeiros, recomendo dois fundos de ações mundiais: o Fidelity MSCI World Index EUR P Acc, que aconselho desde 2019, e o iShares Core MSCI World UCITS ETF USD (Acc), que faz parte das minhas recomendações desde 2015. (Este último fundo é também o meu maior ativo financeiro há mais de 10 anos.)

Fundos de ações para o longo prazo Estes fundos procuram replicar o índice MSCI World, composto por cerca de 1500 ações de empresas de 23 mercados desenvolvidos. São fundos de acumulação, isto é, reinvestem os dividendos recebidos das ações na carteira.
Fidelity MSCI World Index EUR PiShares Core MSCI World UCITS ETF
ISINIE00BYX5NX33IE00B4L5Y983
TipoFundo tradicionalFundo cotado
GestoraFidelity InternationalBlackRock
CustodianteBrown Brothers HarrimanState Street
DisponibilidadeBanco BestBolsas: Xetra (EUNL), Amesterdão (IWDA), entre outras.
Encargo de aquisição2,08%Depende do intermediário.
Encargo de alienaçãoNão tem.
Investimento mínimo e reforço mínimo1 unidade
9,1875€
1 unidade
81,87€
Taxa anual de encargos correntes0,12%0,20%
Rentabilidade de 1 ano19,61%19,95%
Rentabilidade anualizada de 3 anos11,03%11,19%
Rentabilidade anualizada de 5 anos13,56%13,59%
Custo da replicação
5 anos anualizado
0,04%-0,01%
Indicador de risco
1 = baixo; 7 = alto
44

O Fidelity MSCI World Index EUR P é a opção mais simples para ganhar exposição aos mercados acionistas mundiais: subscreve-se junto do Banco Best. O iShares Core MSCI World UCITS ETF exige alguns conhecimentos de negociação bolsista: como escolher o melhor intermediário, como transmitir uma ordem de bolsa, como decidir o montante a investir para minimizar as comissões de bolsa, por exemplo.

A única complexidade que pode surgir durante a subscrição do fundo da Fidelity prende-se com a despesa da operação, que é de 2,08% do montante investido através do Banco Best. Divida o montante que tem disponível para aplicar por 1,0208 para descobrir o valor que deve introduzir no campo da subscrição. Assim, se tiver euros, deve indicar um montante a subscrever de 1000,00 euros. A diferença, 20,80 euros, é o encargo de subscrição: 20,00 euros de comissão de subscrição e 0,80 euros de imposto sobre essa comissão. (Este parágrafo é interativo.)

Há uma alternativa ao Fidelity MSCI World Index EUR P e ao iShares Core MSCI World UCITS ETF: o Vanguard Global Stock Index Fund EUR Investor. O encargo de subscrição do Vanguard Global Stock Index Fund EUR Investor no Bankinter é de 0,5% do montante subscrito com um máximo de 150 euros. Não o recomendo, porque:

A taxa de encargos correntes do Vanguard Global Stock Index Fund EUR Investor é de 0,18% por ano.

O melhor fundo imobiliário

Se não estiver na lista dos milionários, dificilmente conseguirá diversificar o património imobiliário por vários tipos de arrendatários, segmentos e regiões geográficas ao investir diretamente em imóveis. Também neste campo, os fundos de investimento são a melhor opção para a maioria dos aforradores.

Há uma dezena de fundos imobiliários portugueses disponíveis para receber o dinheiro dos investidores, mas quase nenhum é uma boa escolha, porque:

O CA Património Crescente (ISIN: PTSQUBHM002) é o único fundo imobiliário que escapa a estes defeitos:

O fundo Imonegócios, comercializado pelo EuroBic, teve um desempenho superior ao do CA Património Imobiliário nos últimos 5 anos. O seu sobredesempenho foi, todavia, registado exclusivamente em outubro de 2022. Nesse mês, um terreno do Imonegócios localizado junto ao nó da A9 no Zambujal, em Loures, foi reavaliado de 800 mil euros para mais de 7 milhões de euros. É um evento isolado; não é motivo para recomendar este fundo.

A elevada diversificação e estabilidade dos retornos do CA Património Crescente tornam-no numa boa opção para os aforradores que querem diversificar as suas aplicações financeiras, mas não para todos. Este produto é recomendado para quem:

Tenho apenas um alerta sobre o CA Património Crescente: os retornos futuros poderão ser inferiores aos do passado mais recente. Nos últimos anos, os subscritores deste fundo foram habituados a ganhos anuais superiores a 4%, mas os encargos dos imóveis na carteira subiram mais depressa do que as rendas recebidas entre 2019 e 2022. Em 2022, 35% das rendas serviram para pagar as despesas correntes e as reparações dos ativos detidos pelo CA Património Crescente.

A Square Asset Management é a entidade gestora do CA Património Crescente e o depositário é a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo.

Com quem deve preocupar-se?

Ao contrário dos seguros financeiros (garantidos pelos balanços das companhias de seguros) e dos depósitos bancários (que fazem parte do passivo dos bancos), os fundos de investimento pertencem exclusivamente aos seus subscritores ou aos seus acionistas.

Mesmo que a firma que gere o seu fundo, a que guarda os ativos do fundo ou a que comercializa as unidades do fundo entre em falência, o fundo de investimento passará incólume. A sua carteira não seria afetada diretamente por essa falência.

Quando o Banco de Portugal resolveu o Banco Espírito Santo, em agosto de 2014, o fundo Espírito Santo Obrigações Europa continuou a ser gerido por Vasco Teles. Chama-se, hoje, GNB Obrigações Europa e mantém-se como um dos melhores fundos de obrigações que podem ser adquiridos em Portugal, apesar dos maus resultados em 2023. (Não faz, contudo, parte das minhas recomendações.)

Alguns subscritores de fundos geridos pela ESAF, a sociedade gestora do Banco Espírito Santo, perderam dinheiro, mas apenas porque algumas carteiras estavam excessivamente expostas a sociedades que compunham o grupo Espírito Santo.

Os fundos de investimentos têm balanços contabilísticos próprios que as sociedades gestoras são obrigadas a publicar frequentemente. Os investidores mais atentos, bem como jornalistas e analistas, perceberam atempadamente os riscos da concentração do grupo Espírito Santo.

Acredito ser agora muito improvável as entidades gestoras ou depositárias executarem fraudes ou atuarem com má-fé ou com negligência na gestão dos fundo de investimento, porque:

Foi a transposição da diretiva europeia que limitou a exposição dos fundos de investimento aos títulos emitidos pelo grupo da sociedade gestora, em 2013, que marcou o início do fim do Banco Espírito Santo.

Nas situações em que uma entidade não tenha capacidade financeira para reembolsar ou restituir o dinheiro ou os instrumentos financeiros detidos por investidores, há esquemas independentes de garantia. Em Portugal, é o Sistema de Indemnização aos Investidores, que funciona junto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários; protege até 25 mil euros por pessoa.

Noutras nações, os sistemas de compensação podem diferir do português. Os clientes da flatexDegiro, por exemplo, estão protegidos pelo alemão Entschädigungseinrichtung für Wertpapierhandelsunternehmen: podem recuperar até 90% dos seus títulos até 20 mil euros.

Recentemente, o Sistema de Indemnização aos Investidores foi acionado após o Banco de Portugal e o Banco Central Europeu terem revogado as autorizações de atividade à InvestQuest, em 2021, e à Orey Financial, em 2020.

Não conheço situações em que os investidores perderam o acesso a fundos de investimento.

Independentemente do tipo de fundo no qual investe, há sempre duas entidades financeiras envolvidas:

A listagem destas entidades está no documento de informações fundamentais disponibilizado obrigatoriamente aos investidores.

Adicionalmente, há mais uma entidade em que tem de pensar. Se for um fundo tradicional:

Se for um fundo cotado:

Na última vez que avaliei intermediários de bolsa — em encargos e em segurança —, sugeri os portugueses Banco Best (plataforma Best Trading Pro), Banco Carregosa (GoBulling Pro) e Banco Invest (Invest Online) e a germano-neerlandesa flatexDegiro, que atua a nível pan-europeu com a marca Degiro.

Banco Carregosa, Banco Best, Banco Invest, BlackRock, Brown Brothers Harriman, Crédito Agrícola, Fidelity International, flatexDegiro, Square, State Street, Vanguard: as contas destas entidades são públicas e não vejo motivos para duvidar da sua estabilidade financeira.

A Vanguard é um caso particular: a companhia é detida por fundos que gere, logo os investidores são indiretamente donos da sociedade gestora. Os interesses estão alinhados.

A minha resposta à pergunta desta secção é “ninguém”: se investir nestes fundos, não tem de se preocupar. Além de o património dos fundos estar segregado das sociedades gestoras, depositárias, comercializadoras e corretoras, estas firmas são supervisionadas por bancos centrais e autoridades dos mercados de capitais e as suas contas revelam saúde financeira.

Atribuo uma probabilidade minúscula de se registar fraude, má-fé ou negligência nestes fundos de investimento. É tão baixa que aconselho os leitores do boletim tlim a não se inquietarem.

PPR não são a melhor opção

Os planos de poupança-reforma, que, ao contrário dos fundos anteriores, têm benefícios fiscais, não são uma escolha mais inteligente do que simples fundos de investimento? Normalmente, não.

As vantagens fiscais dos PPR são duas:

Infelizmente, os PPR tendem a ser caros e mal geridos e, logo, pouco rentáveis, o que anula o potencial da componente fiscal.

O BBVA Estratégia Investimento PPR, que investe maioritariamente em fundos acionistas, foi provavelmente o PPR mais rentável nos últimos 5 anos. A sua rentabilidade desde o final de 2018 foi de 5,96% por ano. (Escrevo “provavelmente” porque nem todos as sociedades gestoras publicam informação periódica sobre os seus planos.)

O Vanguard LifeStrategy 80% Equity, cuja exposição acionista mais se aproxima do BBVA Estratégia Investimento PPR, não existia há 5 anos, mas, se tivesse sido lançado nessa altura, a rentabilidade anual teria sido próxima de 9,34%, assumindo os desempenhos históricos dos principais fundos na sua carteira e dos seus índices de referência, bem como os seus encargos. O retorno potencialmente superior provavelmente mais do que compensa a tributação menos atrativa. Além disso, é bastante menos volátil do que o BBVA Estratégia Investimento PPR.

Ao aplicar euros no PPR, pode conseguir uma dedução à coleta de euros, encaixada cerca de meses após a subscrição (depois de submeter a declaração anual de IRS). Se alcançar uma rentabilidade bruta de % por ano no PPR e na dedução recebida, acumulará 3732,29 euros ao fim de anos, assumindo uma tributação a 8% sobre os ganhos do PPR e de 28% sobre as mais-valias alcançadas com o investimento da dedução.

Se, em alternativa, aplicar o mesmo montante num fundo de investimento que renda % por ano ao longo do mesmo prazo, a carteira gerará 4076,84 euros, assumindo uma tributação à taxa efetiva de 28%. É mais do que o alcançado pelo PPR.

Os parágrafos anteriores são interativos: mude os campos sublinhados para analisar a sensibilidade dos retornos às variáveis. Verificará que a vantagem fiscal dos PPR é esbatida ou anulada se incluir uma baixa dedução à coleta ou se a duração do investimento for longa.

Esta comparação é potencialmente injusta: assume a tributação mínima dos PPR (8%) e a máxima dos fundos de investimento (28%). A tributação dos fundos pode ser amenizada, nomeadamente através do englobamento das mais-valias (o que pontualmente compensa) e da eventual aplicação do coeficiente de correção monetária pela autoridade fiscal (quando o investimento dura mais de 2 anos).

Os desempenhos passados não garantem a disparidade futura entre os retornos dos PPR e dos fundos indexados. Contudo, se os PPR continuarem a ser muito mais caros, não há motivos para duvidar que os fundos ficarão à frente nos resultados.

Adicionalmente, os PPR também sofrem da não persistência dos resultados: os melhores agora não serão garantidamente os melhores no futuro. No final de 2018, o Alves Ribeiro PPR/OICVM, conhecido por AR PPR, registou o mais elevado desempenho nos 5 anos anteriores, 6,70% por ano. Agora não está entre os 5 PPR mais rentáveis dos últimos 5 anos.

Se se arrependeu de ter subscrito o seu PPR, pode fazer duas coisas:

As condições legais para o reembolso sem penalizações fiscais a quem beneficiou da dedução à coleta na subscrição são:

Até ao final de 2024, o Governo autoriza outras situações legais de reembolso. Não é preciso cumprir o mínimo de 5 anos para pagar prestações do crédito à habitação, desde que a subscrição tenha ocorrido até setembro de 2022. O saldo do PPR também pode ser usado na amortização parcial ou total desses créditos até ao limite de 12 222,24 euros. Ao abrigo da Lei n.º 19/2022, revista pela Orçamento do Estado para 2024, pode resgatar-se adicionalmente até 509,26 euros por mês.

O recém-lançado PPR Golden SGF ETF é um candidato a disruptor no mercado dos planos de reforma: tem uma estratégia passiva de investimento em fundos de índice. Porém, não o recomendo, porque:

Investimento direto em ações e obrigações

Desaconselho o investimento direto em obrigações: os encargos e os impostos reduzem drasticamente a rentabilidade potencial destes instrumentos, como mostrei detalhadamente na edição anterior do boletim tlim.

Pelos mesmos motivos, tenho também desaconselhado à maioria dos investidores a negociação de ações. Hoje, todavia, tenho dúvidas sobre essa recomendação.

O retorno do investimento direto em ações resulta dos ganhos de capitais (a variação de preço) e dos dividendos distribuídos pelas empresas, subtraídos de eventuais encargos e impostos. Há informações recentes que abalaram as minhas anteriores convicções, incluindo:

As vantagens e as desvantagens do investimento direto em ações merecerá uma análise muito mais profunda numa futura edição do boletim tlim. Por isso, este “Onde investir em 2024” não inclui recomendações de ações individuais.

As melhores opções de baixo risco

As aplicações de risco reduzido devem almejar a uma única coisa: oferecer um retorno real positivo, isto é, render mais do que o que se espera que a inflação roube ao poder de compra da poupança.

Os principais organismos económicos nacionais e internacionais calculam que a inflação seja próxima de 3% em 2024. O Banco de Portugal, o mais recente a rever as suas previsões, aponta para 2,9%. Assumindo uma tributação de 28% sobre os ganhos, a sua aplicação de baixo risco deveria propor uma taxa de rendimento superior a 4% em 2024.

Depósitos generosos Estes são os únicos depósitos na banca nacional que concedem taxas de juro de 4% ou superiores. Infelizmente, a maioria não é uma boa escolha, porque há muitas restrições e encargos.
BancoDepósitoTaxa anual nominal brutaPrazoMontante
BankinterBK Mini5,00%12 meses100€ a 1000€
BankinterConta Broker5,00%não aplicávelaté 10 000€
BankinterConta Mais Ordenado1.º ano: 5,00%
2.º ano: 2,00%
não aplicávelaté 10 000€
NovobancoConta 100% Dupla Vantagem5,00%não aplicávelaté 1000€
NovobancoConta 360º Dupla Vantagem5,00%não aplicávelaté 2500€
BiGSuper Depósito4,25%3 meses5000€ a 50 000€
Haitong BankDepósito a Prazo HB sem mobilização4,15%720 diasinformação não disponível
Banco Português de Gestãobpg save4,10%365 dias5000€ a 250 000€
BAI EuropaDepósito Novos Clientes4,00%180 dias2500€ a 100 000€
Banco BestDepósito Novos Clientes4,00%180 dias2500€ a 75 000€
Banco Português de Gestãobpg start4,00%92 dias2500€ a 100 000€
BankinterDepósito Net Boas Vindas4,00%4 mesesa partir de 10 000€
Bison BankBison Rendimento Premium4,00%12 meses25 000€ a 100 000€
BiGSuper Depósito4,00%6 meses2500€ a 75 000€
BNI EuropaBNI Europa 183 Dias — Não Mobilizável4,00%183 diasa partir de 2500€
BNI EuropaBNI Europa 366 Dias — Não Mobilizável4,00%366 diasa partir de 2500€
Haitong BankDepósito a Prazo HB4,00%720 diasinformação não disponível

A maioria dos depósitos no quadro anterior não são boas escolhas. Muitos têm exigências que são difíceis de satisfazer: o BK Mini é apenas para crianças e a Conta Broker exige que faça muitas operações de bolsa. Outros são aplicações promocionais que não se podem repetir: os Super Depósitos do BiG e os Depósitos Novos Clientes do BAI Europa e do Banco Best, por exemplo. Também é possível que os depósitos tenham encargos implícitos: as Contas 100% Dupla Vantagem e 360º Dupla Vantagem do Novobanco têm encargos mensais; para aceder aos depósitos a prazo do Banco Português de Gestão é preciso pagar mensalmente pela conta à ordem de suporte. Às vezes, as despesas são ridiculamente elevadas: o Bison Bank cobra 175 euros por trimestre.

Se ainda não beneficiou da Conta Mais Ordenado do Bankinter, recomendo-lhe que o faça se tiver até 10 mil euros para aplicar e se reunir as condições para ganhar 5% no primeiro ano e 2% no segundo ano: receber transferências de 800 euros em 2 meses por trimestre, pelo menos, concretizar 5 operações com cartão de crédito por semestre e não ter crédito à habitação associado a essa conta. Um saldo de 10 mil euros ou superior rende 366 euros no primeiro ano e 146 euros no segundo.

Em alternativa, se tiver mais de 5000 euros para aplicar durante 2024, os melhores depósitos são os do BNI Europa, porque, a partir desse montante, o banco não cobra o encargo mensal de manutenção da conta à ordem de suporte, de 2,60 euros. O depósito BNI Europa 366 Dias — Não Mobilizável renderá 292,80 euros com 10 mil euros.

Independentemente do banco que escolher para os seus depósitos, não aplique mais de 100 mil euros por titular. É esse o montante protegido pelo Fundo de Garantia de Depósitos ou pelo Fondo de Garantía de Depósitos de Entidades de Crédito, no caso de instituições espanholas, como o Bankinter.

E se quiser uma aplicação de baixo risco que vá além de 2024? Se tiver mais de 5000 euros, recomendo-lhe os depósitos do BNI Europa que permitem a mobilização antecipada: a taxa de juro é de 3,75% a 24 meses, de 3,75% a 36 meses, de 3,25% a 4 anos e de 3% a 5 anos.

Para aplicar durante aproximadamente 5 anos, há uma alternativa: o iShares iBonds Dec 2028 Term € Corp UCITS ETF EUR (Acc). É um fundo de obrigações de prazo definido.

iShares iBonds Dec 2028 Term € Corp Este fundo de índice tem replicação física por amostragem. É um produto de acumulação (não distribui dividendos) que rebalanceia a sua carteira mensalmente.
ISINIE0008UEVOE0
TipoFundo cotado
GestoraBlackRock
CustodianteState Street
Taxa anual de encargos correntes0,12%
Rentabilidade anual até à maturidade na carteira3,15%
Tempo médio para vencimento na carteira4,48 anos
BolsasMilão, Paris, Xetra

Este fundo investe exclusivamente em emissões obrigacionistas de baixo risco (rating BBB ou superior) que se vencem em 2028. Resumidamente, o processo de investimento é o seguinte:

  1. O investidor compra o fundo.

  2. O fundo é composto exclusivamente por obrigações de baixo risco de de empresas, em euros, que se vencem em 2028.

  3. Nesse ano, à medida que as obrigações são reembolsadas, são substituídas por títulos de curto prazo dos tesouros alemão e francês. Nos últimos meses, o dinheiro do fundo fica disponível em caixa.

  4. Se o investidor não vender as suas unidades até ao último dia do ano, a sociedade gestora reembolsa-o pelo valor contabilístico dos títulos e retira o fundo da bolsa no primeiro dia do ano seguinte.

  5. Após a venda ou o reembolso, o investidor tem de declarar a mais-valia ao fisco.

A BlackRock, a sociedade gestora, publica diariamente a taxa média de rentabilidade até à maturidade das obrigações na carteira do fundo, bem como o tempo médio para o vencimento, para permitir aos investidores saberem aproximadamente quanto ganharão com o investimento. Aliás, o simulador na página oficial do iShares iBonds Dec 2028 Term € Corp indica que a sua rentabilidade anual estimada é de 3,03% até ao vencimento. Esse número assume a aquisição das unidades do fundo ao valor patrimonial, os encargos do produto e a manutenção até ao final de 2028.

Aos contrário dos rendimentos dos depósitos a prazo, que são alvo de retenção na fonte, os ganhos do iShares iBonds Dec 2028 Term € Corp são mais-valias: a tributação é feita após a submissão da declaração anual de IRS. Assumindo a rentabilidade anual estimada pela BlackRock, uma tributação à taxa de 28% em meados de 2029 e que o encargo bolsista na compra e na venda (ou reembolso) é de 10 euros, a rentabilidade anual líquida de investir 5000 euros no iShares iBonds Dec 2028 Term € Corp será de 2,20% por ano, o que é superior à rentabilidade anual líquida do depósito a 5 anos do BNI Europa, de 2,10%.

A rentabilidade anual líquida de 2,20% é apenas uma aproximação: os detentores de unidades do iShares iBonds Dec 2028 Term € Corp podem vender os seus títulos antes do vencimento, mas esse retorno aproximado é apenas válido perto da maturidade do produto.

Se considerar ser complicado abrir uma nova conta bancária para aceder aos melhores depósitos a prazo ou investir na bolsa para conseguir retornos mais elevados ou se deseja uma aplicação ainda menos arriscada, subscreva Certificados de Aforro.

Os Certificados de Aforro são títulos garantidos pela República Portuguesa cuja remuneração funciona da seguinte forma:

Se a Euribor a 3 meses estabilizar em % (o que não acontecerá), um subscritor que invista agora euros em Certificados de Aforro durante anos receberá 1101,80 euros em capital e juros. A sua rentabilidade líquida de impostos seria de 1,96% por ano, assumindo uma taxa de tributação de 28%. (Este parágrafo é interativo.)

A Euribor a 3 meses, recentemente nos 3,909%, está acima do valor que maximiza o retorno dos Certificados de Aforro, 2,50%. Se permanecer nesse nível ou acima durante uma década, a rentabilidade líquida desta aplicação será de 2,10% por ano.

Os Certificados de Aforro podem ser subscritos através do AforroNet, a plataforma da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública, e em alguns balcões dos CTT e Espaços Cidadão. A aplicação mínima é de 100 euros.

O resgate dos Certificados de Aforro pode ser pedido em qualquer altura após os três primeiros meses. Recebe-se o valor investido acrescido dos juros capitalizados, mas perdem-se os juros corridos desde o último pagamento. Se não se solicitar o resgate até ao décimo quinto aniversário, é efetuado o reembolso nessa data por transferência para a conta bancária do subscritor.

Resumo

Neste artigo, recomendei os seguintes instrumentos:

A minha principal recomendação é investir no fundo Vanguard LifeStrategy que mais se concilia com o seu conforto perante a volatilidade. Essa aplicação pode ser complementada com Certificados de Aforro na componente da sua carteira que planeia resgatar no curto ou no médio prazo.

Se não se sente confortável a negociar na bolsa, combine o Fidelity MSCI World Index EUR P — através de uma Conta Digital no Banco Best (gratuita nos principais serviços; dispense os cartões bancários) — com Certificados de Aforro. A proporção do património no fundo de investimento deve respeitar a sua capacidade de aguentar os altos e baixos da carteira.

Um fundo e, opcionalmente, Certificados de Aforro é a estratégia mais descomplicada que muitos aforradores podem adotar. A simplicidade ainda é o segredo dos investimentos. ★

Respondido

“Cheguei à conclusão que o Xtrackers MSCI World Quality Factor UCITS 1C bate o iShares Core MSCI World UCITS ETF em praticamente todos os parâmetros.”

“Porquê apostar no iShares Core MSCI World UCITS ETF e não num fundo focado em dividendos, como o Vanguard FTSE All-World High Dividend Yield UCITS ETF?”

Juntei estas duas perguntas dos leitores F.M. e T.S., porque prendem-se com o mesmo tema: o investimento em fatores.

Resumindo cerca de 60 anos de investigação académica em poucas linhas: após se acreditar que o desempenho de uma ação dependia essencialmente do movimento do mercado, demonstrou-se que a expectativa de retorno pode ser modelada por vários fatores económicos e financeiros. Eugene Fama e Kenneth French, então na Universidade de Chicago, publicaram o trabalho-chave nesta área em 1992: as empresas mais pequenas e de valor rendem mais. Os fatores dimensão e valor começaram, então, a entrar no léxico dos investidores. (Fama recebeu o Prémio Nobel da Economia em 2013 com Robert Shiller e Lars Peter Hansen).

Estudos posteriores avaliaram mais de 300 fatores que explicam o desempenho acionista. Porém, os que ficaram mais famosos são:

Teoricamente, as carteiras de ações selecionadas por estes fatores eram persistentemente mais rentáveis no longo prazo. Passou-se, então, da teoria para a prática: lançaram-se índices de ações selecionadas pelos critérios fatoriais e, posteriormente, fundos que replicavam esses índices.

Os fundos de índice ainda são recentes, mas a extrapolação histórica permite retirar conclusões animadoras. Por exemplo, segundo a Curvo, o iShares MSCI World Quality Dividend UCITS ETF USD (dividendos), o iShares Edge MSCI World Momentum Factor UCITS ETF (momento), o iShares Edge MSCI World Quality Factor UCITS ETF (qualidade) e o iShares Edge MSCI World Value Factor UCITS ETF (valor) teriam batido o iShares Core MSCI World UCTIS ETF (todos os mercados desenvolvidos) desde a década de 1990.

Infelizmente, nem sempre funcionam. O iShares Edge MSCI World Size Factor UCITS ETF (dimensão) teria rendido menos do que o fundo de ações dos mercados desenvolvidos desde 1994. Pior: o iShares Edge MSCI World Multifactor UCITS ETF, que, excluindo os dividendos, combina todos os fatores anteriores, teria rendido menos do que o iShares Core MSCI World UCTIS ETF desde 2014, segundo a simulação da Curvo.

Na edição de 2020 do Credit Suisse Global Investment Returns Yearbook, Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton avisaram que “um fator que fica no topo do desempenho num determinado ano pode continuar lá, descer ou ficar a meio da tabela no ano seguinte”.

É possível que o investimento em fatores continue a compensar maioritariamente os investidores, mas há uma probabilidade não negligenciável de isso não acontecer. É preciso muita confiança na teoria académica para recomendar ou investir em fundos de investimento fatorial. Apesar do meu longo estudo universitário na área — a minha tese de mestrado é neste campo —, não tenho essa confiança.

Se quiser fazer o seu estudo, recomendo as bases de dados de Kenneth French. O investigador continua a atualizá-las periodicamente.

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“Poderia analisar a estratégia da XTB de também remunerar o dinheiro não investido dos seus clientes?”

Na edição anterior do boletim tlim desaconselhei o parqueamento de fundos na Trade Republic, o intermediário de bolsa que paga uma taxa anual de 4% sobre o dinheiro não investido. Escrevi:

No caso (muito improvável) de falência ou de fraude do banco responsável pela conta omnibus, os clientes do Trade Republic não lhe podem exigir os seus capitais. Duvido que consigam recuperar facilmente o dinheiro, porque, individualmente, não são clientes do Citibank Europe, do Solaris, do J.P. Morgan ou do Deutsche Bank.

O leitor L.M. perguntou-se se essas condições também se aplicam aos clientes da sucursal portuguesa da XTB. Sim: os fundos não investidos, que rendem agora uma taxa anual de 3,8% para os novos clientes e de 2% para os mais antigos, são depositados pela XTB num banco. É a XTB que é cliente desse banco; os clientes da XTB não são clientes dessa instituição e, logo, não lhe podem exigir os capitais em caso de falência ou fraude.

Em 2022, quando perguntei anonimamente à equipa da XTB qual era o banco de que eram clientes, indicaram-me o Citibank.

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“Para a malta entusiasmada com o Milei na Argentina, há alguma forma de investir naquele país e tentar aproveitar a possibilidade de a economia desse país poder ter batido no fundo?”

Conheço apenas um instrumento financeiro acessível aos investidores portugueses para obter exposição exclusiva e diversificada aos mercados bolsistas argentinos: o fundo Global X MSCI Argentina ETF, listado na NYSE Arca com o código de negociação ARGT.

O ARGT procura replicar o índice MSCI All Argentina 25/50, tendo, por isso, um mínimo de 25 empresas argentinas. No rebalanceamento trimestral, nenhuma empresa pode absorver mais de 25% da carteira e as que representam mais de 5% não podem somar mais de 50% do património do fundo.

O leitor E.C., que me enviou a pergunta, pode estar interessado em ações individuais. É possível investir em cerca de duas dezenas de empresas argentinas através das bolsas norte-americanas. É o caso, por exemplo, da petrolífera YPF (Nova Iorque: YPF), do Grupo Financiero Galicia (Nasdaq: GGAL) e da Pampa Energía (Nova Iorque: PAM). Não se investe, contudo, diretamente nas ações das companhias; o que está disponível para transacionar são certificados (american depositary receipts) que representam a propriedade de ações de sociedades não-estado-unidenses. Os encargos de negociar estes certificados são normalmente mais elevados do que os custos tradicionais de transacionar ações.

Os fundos de ações latino-americanas, como o DWS Invest Latin America Equities e o Amundi MSCI EM Latin America UCITS ETF, normalmente não se expõem à Argentina. O índice MSCI Emerging Markets Latin America não inclui a Argentina.

Como expliquei no artigo principal desta edição, não recomendo o investimento em fundos dedicados a uma única nação nem em fundos de mercados emergentes. Mesmo que Javier Milei, o ultraliberal recém-empossado Presidente da Argentina, consiga controlar a inflação, diminuir a pobreza e convencer a população, não é certo que investir nas bolsas argentinas seja um bom negócio.

O ARGT rendeu, em euros, 96,91% desde que se estreou na bolsa, em março de 2011. Um fundo de ações dos mercados desenvolvidos, como o iShares Core MSCI World UCITS ETF, rendeu quase o triplo. ★

Visto

Mais bolsa

As regras sãs de investimento não mudaram. Resista à tentação de mudar a sua estratégia.

Dito

Cory Doctorow:

“Se comprar não dá propriedade, a pirataria não é roubar.”

A frase anterior não é originalmente de Cory Doctorow; é de Tyler James Hill. Doctorow conseguiu, porém, levá-la mais longe num longo artigo explicativo.

As grandes companhias do mundo perceberam que ganhariam mais dinheiro a desenvolver soluções que poderiam ser revogadas não consensualmente à distância. O exemplo mais recente: quem comprou (ou, melhor, “comprou”) séries da Warner através da PlayStation ficou sem acesso a elas. Pagaram pelos episódios, mas não os podem ver. Não têm a propriedade.

Não é a primeira vez que Doctorow escreveu sobre esta tendência de reduzir a qualidade oferecida numa plataforma. Até lhe deu um nome: enshittification, o que se pode traduzir como emerdamento. É fácil perceber o raciocínio dos líderes das firmas: no ciclo de arranque, a empresa regista prejuízos para oferecer um bom produto ao melhor preço aos seus clientes; na segunda etapa, quando os clientes estão habituados, retiram remotamente qualidades ao produto, gerando lucros e emerdando o produto ou o serviço.

Se os utilizadores que pagaram não têm controlo sobre o que compraram, não são proprietários. Logo, obter esse produto — um filme, um episódio de uma série, uma música, um livro — por meios alternativos (conhecidos anteriormente por “pirataria”) não é um delito, porque também não fornece a propriedade. Tal como também não é uma violação tentar impedir que a empresa retire remotamente qualidades ao produto, através, por exemplo, de alteração ao seu código informático (também conhecido anteriormente por “pirataria”).

Um exemplo para se perceber melhor. A partir de 2016, a HP atualizou remotamente (via Internet) as impressoras dos seus clientes para não aceitarem cartuchos de tinta produzidos por outros fabricantes. Defendeu-se dizendo que procurava a melhor experiência para os consumidores. Os “proprietários” das impressoras ficaram com um aparelho emerdado: tinha agora menos capacidades do que antes. Seria pirataria se um “proprietário” alterasse o código informático da sua impressora para não aceitar a atualização remota da HP? Seria pirataria se esse “proprietário” quebrasse a placa de ligação à Internet da impressora para se manter realmente proprietário do equipamento?

Não defendo (ainda) estas medidas drásticas, mas a lógica de Tyler James Hill e Cory Doctorow é difícil de refutar. ★

Mais literacia financeira

O acordo que tenho com os subscritores do boletim tlim é publicar mensalmente seis mil palavras que, conjuntamente, tenham qualidade na área das finanças pessoais. Nesta edição, escrevi muito mais do que o dobro e, julgo, não reduzi a excelência dos conteúdos.

Solicito-lhe, se tiver margem, um donativo para remunerar o meu trabalho e para apoiar o desenvolvimento das futuras edições. Se quiser e puder apoiar a continuidade desta publicação, o donativo sugerido é de 6 euros por mês, mas deve ser inferior ou superior em função da sua capacidade financeira e da utilidade desta publicação.

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Obrigado.

— David Almas